Os analistas que cobrem a Unilever deviam estar esperando uma sacola de brindes extraordinariamente boa quando deixaram, nesta semana, a reunião anual da gigante dos produtos de consumo com os investidores em sua recém-ampliada sede em Englewood Cliffs, Nova Jersey.
O departamento de fusões e aquisições da companhia anglo-holandesa, que fabrica o sabonete Dove e o sorvete Magnum, tem estado tão ocupado nos últimos três anos que se quisesse distribuir amostras de todos esses negócios, seriam necessárias malas para colocar todas elas.
A aquisição nesta semana da Sundial Brands, uma companhia britânica de cuidados com a pele, cujos clientes são principalmente afro-americanos, eleva para 18 o número de negócios desde o começo de 2015. Segundo estimativas de analistas, a Unilever gastou € 8,8 bilhões nessas fusões e aquisições – uma média de € 500 milhões por aquisição e bem pouco em comparação com os grandes negócios do setor.
As aquisições com propósito definido ou “bolt-on acquisitions” não são incomuns no setor de produtos de consumo, mas a maratona de compras da Unilever – marcada pela ausência de grandes fusões e aquisições – foi transformada em um plano sob o comando do executivo-chefe Paul Polman.
“Temos uma estratégia muito boa de aquisições constantes e consistentes. Ela está claramente dando certo para nós e estamos muito satisfeitos com isso”, disse Polman, em julho. Ele espera que o que começou com aquisições esporádicas venha a contribuir rapidamente para o aumento das receitas, agregando conhecimento e inovação ao longo do caminho.
Como outros grandes grupos de produtos de consumo, a Unilever está sofrendo com a desaceleração do crescimento das vendas. O conglomerado encontrou em empresas menores uma maneira de obter produtos que ganham evidência rapidamente, conhecimento sobre o comércio eletrônico e exposição aos mercados locais a que quer chegar.
Martin Deboo, analista da Jefferies, de serviços financeiros, diz que as grandes empresas de produtos de consumo, atoladas na burocracia, tendem a não ser boas na detecção de novos produtos – mas são boas em produzi-los e lançá-los.
“O que a Unilever está fazendo é muito inteligente”, afirma Deboo. “É uma estratégia de fusões e aquisições que reconhece a maneira como a indústria de bens de consumo está mudando; uma estratégia voltada para segmentos, canais e nichos mais sofisticados, que o núcleo da Unilever simplesmente não consegue acessar.”
Grosso modo, as aquisições se encaixam em três categorias: premium, tendências e expansão do mercado local. A maioria está na área de cuidados pessoais, reforçando o interesse de Polman de manter a Unilever bastante voltada a esse setor.
Mas há algumas aquisições no setor de alimentos, incluindo a fabricante de condimentos Sir Kensington, que produz
maionese vegana.
Outras aquisições premium incluem as empresas de produtos de cuidados com a pele Dermologica e REN. As categorias de tendências são exemplificadas pelos chás de ervas orgânicos Pukka British e a fabricante de produtos de lavanderia à base de plantas Seventh Generation.
A operação on-line Dollar Shave Club permitiu à Unilever compreender uma área totalmente nova. Conforme disse Polman no ano passado, na ocasião da aquisição, “quando se trata de uma grande companhia como a nossa, tem-se dificuldade em estabelecer [um modelo de assinatura] porque a cultura e o conhecimento simplesmente não estão lá”.
Os negócios locais que a Unilever vai ampliar nos mercados regionais incluem a fabricante de produtos de cuidados com a pele Carver Kores, da Coreia do Sul – um negócio de € 2,3 bilhões, o maior dos 18 realizados.
A principal questão, porém, é se esses negócios são grandes o suficiente para fazer diferença para a Unilever. Combinadas, as 18 aquisições têm vendas de € 2,3 bilhões, segundo estimativas de analistas, o que é pouco comparado às receitas anuais da Unilever em 2016, de € 52,7 bilhões.
Graeme Pitkethly, diretor financeiro, disse na quarta-feira – o primeiro dos dois dias do evento – que as receitas desses grupos cresceram 16% em nove meses no ano (comparado ao crescimento geral das vendas de 2,8%). Ele acredita que elas contribuirão com 1% para o crescimento orgânico das vendas em 2019.
Pinar Ergun, analista da UBS, outra empresa de serviços financeiros, diz que isso representa uma comparação desfavorável frente à L’Oréal, o grupo francês de cosméticos. “A Unilever vem sendo lenta na globalização desses ativos, enquanto a L’Oréal é excepcionalmente rápida em pegas marcas pequenas e lança-las em novos mercados em escala total”, diz Pinar.
“Algumas dessas aquisições poderão não levar a um grande crescimento, mas o que a Unilever está tentando fazer é aumentar sua participação de mercado em todos esses produtos”, afirma Naaguesh Appadu, pesquisadora do Centro de Fusões e Aquisições da Cass Business School, do Reino Unido.
Há também a questão de que a Unilever tenha pago caro demais por algumas dessas empresas. “Dados os valores pequenos dos negócios, a Unilever tem fornecido somente informações [financeiras] limitadas. No entanto, é justo dizer que as aquisições dos últimos três anos provavelmente foram caras”, diz Andrew Wood, analista da corretora Bernstein.
Ele estima que a Unilever pagou um preço médio de aquisição de cerca de quatro vezes as vendas, o que está acima da média de 3,5 vezes para os negócios envolvendo empresas de produtos pessoais e domésticos.
Polman não descartou explicitamente uma grande aquisição. “Sempre analisamos todas as opções; seria uma estupidez não fazer isso”, disse ele, em julho.
Com a busca por seu sucessor em andamento, depois de o executivo passar nove anos no comando, será que essa resistência poderá esmorecer, especialmente depois da audaciosa e abortada tentativa da Unilever de assumir o controle da Kraft Heinz, por US$ 143 bilhões?
Warren Ackerman, analista do Société Générale, diz acreditar que a antipatia da Unilever [por grandes aquisições] tem origem em uma experiência infeliz em seu último negócio desse tipo, há quase duas décadas. “Nos parece que a Unilever ainda carrega as cicatrizes da aquisição da Bestfoods por US$ 20 bilhões no ano 2000, em que ela pagou caro demais por marcas como Hellmann’s e Knorr”, diz ele.
Mas Ackerman afirma que um negócio com uma grande companhia como a Colgate-Palmolive, com valor de mercado de US$ 63 bilhões, ou Estée Lauder, a companhia de cosméticos com valor de mercado de US$ 46 bilhões, consolidaria as ambições da Unilever na área de cuidados pessoais, ajudando a alavancar o crescimento dos volumes de vendas e fornecendo proteção contra outra tentativa de compra.
“Será que o choque da proposta da Kraft Heinz levou a Unilever a mudar de mentalidade sobre as grandes fusões e aquisições, uma vez que as barreiras de entrada estão caindo e a fragmentação aumentando?”, pergunta Ackerman.
Fonte: Valor